ØRGIA

 

JOHNNY HOOKER lança álbum de inéditas após quatro anos.

 

Foto: Divulgação.

Recife, 1960. Tulio Carella, dramaturgo e roteirista argentino, desembarca em Recife e a sua entrada nesse mundo novo rende uma série de aventuras sexuais pelas ruas e cabarés da cidade portuária. Não demora muito até que a sombra da ditadura se espalhe e, assim, Tulio é preso e extraditado de volta para a Argentina, que estava prestes a ser tomada por um regime tão sanguinário quanto o tupiniquim. Posteriormente, os contos escritos pelo autor durante esse período dariam origem ao livro "Orgia - Diários de Tulio Carella", inspiração para o novo disco de Johnny Hooker, ‘’ØRGIA’’, já lançado.

São Paulo, 2018. Depois de um período de avanços democráticos e legais, em relação aos direitos LGBTQIAP+ no Brasil, as eleições trazem de volta ao poder adoradores da ditadura, militares e fascistas. É neste cenário que Johnny Hooker se encontra com a obra de Tulio Carella. Quase como se o tempo não tivesse passado, o país vive novamente um momento onde o fascismo se impõe, recorrendo ao pânico moral para se vender como solução aos problemas da nação. Neste contexto, surge a ideia: "Por que não escrever um disco que seja também o diário de um período em que o futuro está sequestrado, em que o corpo e o desejo se apresentam como uma forma poderosa de resistir?".

Sendo asism, "ØRGIA" é o terceiro disco de estúdio da carreira de Johnny Hooker e sucede os aclamados "Eu Vou Fazer uma Macumba pra Te Amarrar, Maldito!" e "Coração". Assim como o livro homônimo de Carella, o álbum busca desenhar a narrativa de um tempo onde a perseguição das minorias tem um novo momento de frisson no país. Ao decorrer de 13 faixas, o artista apresenta a história em três atos e um epílogo, assim como em um livro.

O disco começa pelas faixas "Amante de Aluguel" e "Nos Braços de Um Estranho", que têm o êxtase da noite e sua carnalidade pulsante. Seguido por "Cuba" e "Maré", o álbum cria uma espécie de delírio tropical de fuga e, finalmente, chegando aos tempos apocalípticos que se desenham diante dos olhos, estão as faixas "Eu Te Desafio a Me Amar" e "Estandarte". O epílogo conta com uma versão em espanhol da já clássica "Volta", agora "Vuelve", adaptada por Julia Konrad. Ele sugere o exílio conceitual do Brasil tanto para Carella, quanto para o próprio Hooker, embora seja impossível deixar para trás o sentimento de pertencimento, como ouvimos em um trecho da faixa de abertura: "(...) Penso que no final, o Brasil é essa dor que vive em mim".

O disco foi trabalhado durante quatro anos e é assinado por produtores como Arthur Marques, DJ Thai, Felipe Puperi, João Inácio da Silva, Barro e Guilherme Assis. Nas letras, alternam-se composições do próprio Hooker e outras recebidas como presente, escritas especificamente para o disco, como "Maré", de Juliano Holanda, em que o cantor divide os vocais com o capixaba Silva. Já "Nossa Senhora da Encruzilhada" foi escrita por Filipe Catto, que também assina a identidade visual do projeto junto com o fotógrafo Carlos Salles e o multiartista Alma Negrot. Completando o time, as faixas “Larga Esse Boy” e "NHAC!" contam, respectivamente, com participações especiais de Jader e Chameleo. Thiago ABRA ficou responsável pela mixagem e a produção adicional e a masterização é de Filipe Tichauer.

“ØRGIA” é um "talvez disco de despedida", que passeia por toda a heterogeneidade da obra de Hooker - do brega ao forró, do samba ao flamenco, do pop à experimentação. Uma verdadeira orgia de ritmos em busca do reencontro com o corpo e com a vontade de viver, como ouvimos na faixa de abertura; um relato de um tempo em que o futuro é uma imensa e irrevogável incógnita.

 

Por: Clilton Paz.

Fonte: Gyovanna Altino.